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O eixo maléfico – o FMI, o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio – continua a impor ao mundo a ditadura do mercado, a supremacia do setor privado, o culto ao lucro, provocando, no planeta inteiro, uma terrível devastação
- (01/03/2002)
Três frentes: as pessoas devem conscientizar-se de que a globalização ataca as sociedades, daqui em diante, em três frentes. Isto é fundamental porque envolve o conjunto da humanidade. A primeira frente é a da economia. Continua localizada sob a condução do que deveria ser chamado o “eixo do mal”, composto pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio (OMC). Esse eixo maléfico continua a impor ao mundo a ditadura do mercado, a supremacia do setor privado, o culto ao lucro, provocando, no planeta inteiro, uma terrível devastação: da hiperfalência, fraudulenta, da Enron, à crise monetária na Turquia, do calamitoso colapso da Argentina à destruição ambiental por toda parte...
E a próxima Conferência Internacional sobre o Financiamento do Desenvolvimento, que se realizará em Monterrey (México), nos dias 21 e 22 de março, poderá agravar ainda mais o desastre geral, caso venha a apoiar a proposta de que o setor privado seja o principal ator de desenvolvimento dos países do hemisfério Sul1... É particularmente escandaloso que os chefes de Estado e de governo, em especial os da União Européia, se recusem a adotar, em favor do desenvolvimento, as únicas medidas indispensáveis para salvar da miséria dois terços da humanidade.
Podem ser citadas dez: cancelar totalmente a dívida dos países pobres; criar um sistema de avaliação – amplo, justo e imparcial – das dívidas de todos os países do hemisfério Sul; definir garantias para que futuros financiamentos sejam aplicados em condições satisfatórias e em favor do desenvolvimento sustentável; obter, junto aos países ricos, o compromisso de que destinem um mínimo de 0,7% de sua riqueza ao financiamento do desenvolvimento; reequilibrar os termos de intercâmbio comercial entre o hemisfério Norte e o hemisfério Sul; garantir a soberania alimentar a cada país; controlar os movimentos irracionais de capitais; proibir o sigilo bancário; declarar ilegais os paraísos fiscais; e, finalmente, criar uma tarifa internacional para as transações financeiras.
A segunda frente, clandestina, silenciosa e invisível, é a ideológica. Com a colaboração atuante de universidades, de institutos de pesquisa famosos (Heritage Foundation, American Enterprise Institute, Cato Institute) e dos grandes meios de comunicação (o canal CNN, The Financial Times, The Wall Street Journal e The Economist, imitados por quase toda parte por uma multidão de jornalistas subservientes), foi criada uma verdadeira indústria da persuasão com o objetivo de convencer os habitantes do planeta que a globalização liberal traria, por fim, a felicidade universal. Apoiando-se no poder da informação, ideólogos construíram, dessa forma, e com a cumplicidade passiva dos dominados, o que se poderia chamar um delicioso despotismo2.
Essa manipulação foi oficialmente relançada, após o 11 de setembro de 2001, com a criação, pelo Pentágono, de um Departamento de Influência Estratégica – nos moldes característicos de George Orwell –, explicitamente encarregado de disseminar falsas informações para “intoxicar” a imprensa internacional e “influenciar a opinião pública e os dirigentes políticos, tanto nos países amigos como inimigos3”. Como nas décadas mais nefastas do macartismo e da guerra fria, e sob o controle do Ministério da Defesa norte-americano, é criado, portanto, uma espécie de ministério da desinformação e da propaganda, encarregado de estabelecer – como as ditaduras retratadas no teatro surrealista – a verdade oficial...
A terceira frente, por enquanto inexistente, é militar. Nasceu logo após o traumatismo do 11 de setembro de 2001. Tem por objetivo dotar a globalização liberal de um aparelho de segurança adequado. Embora, por algum tempo, parecessem tentados a confiar essa missão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), os Estados Unidos decidiram assumir sozinhos, dotando-se de meios consideráveis para exercê-la com a mais impressionante das eficiências (leia, nesta edição, o artigo de Paul-Marie de La Gorce). A recente guerra no Afeganistão, contra o regime taliban e a rede Al-Qaida, convenceu Washington de que, para missões dessa envergadura, é inútil pedir uma colaboração militar – a não ser que seja mínima – a seus principais aliados estratégicos: a Grã-Bretanha, a França e até a Otan4.
Essa atitude de desprezo foi confirmada pelo recente anúncio, sem consulta prévia a seus aliados, da intenção de Washington de atacar, proximamente, o Iraque. Os protestos das chancelarias européias, que já começam a diminuir, não impressionaram o governo norte-americano. A função dos vassalos é a de se inclinarem, e os Estados Unidos atualmente aspiram a exercer um domínio político absoluto. “De certa forma, os Estados Unidos são o primeiro país proto-mundial”, constata William Pfaff. “Têm a capacidade de tomar a dianteira de uma versão moderna do Império universal, um império espontâneo cujos membros se submetem voluntariamente à sua autoridade5.”
Esse império aspira a certas realizações no âmbito da globalização liberal. Quaisquer oponentes, dissidentes ou resistentes devem, a partir de agora, saber que serão combatidos nessas três frentes: econômica, ideológica e militar. E que os tempos de respeito pelos direitos humanos parecem ultrapassados, como demonstra o escandaloso estabelecimento de uma “prisão tropical de trabalhos forçados” em Guantanamo, onde vários europeus (franceses, ingleses, espanhóis...) estão enclausurados em jaulas. O eixo do mal (o FMI, o Banco Mundial e a OMC) estava escondendo seu rosto. Agora, já o conhecemos. (Trad.: Jô Amado)
1 Ler “Projeto de conclusões e decisões da Conferência Internacional sobre o Financiamento do Desenvolvimento”, Nações Unidas, Assembléia Geral, 30 de janeiro de 2002, documento A/AC.257/L.13. 2 Ler, de Ignacio Ramonet, Propagandes silencieuses, ed. Galilée, Paris, 2000. 3 International Herald Tribune, 20 de fevereiro de 2002. 4 Ler Guerres du XXIème siècle, ed. Galilée, a ser lançado no dia 14 de março de 2002. 5 International Herald Tribune, 7 de janeiro de 2002.