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WAHABISMO

O Islã ao pé da letra

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O que é, como surgiu e por que avança, junto com a globalização, a corrente islâmica que rejeita qualquer influência cultural, quer impor um código de conduta único e está associada a atos violentos

Olivier Roy - (01/04/2002)

Não se trata de um movimento estruturado, mas de uma visão do islamismo que prioriza uma leitura literal e puritana do Corão

Sob pressão da globalização, emerge uma nova corrente no islamismo. Ela se restringe a definir um sistema de normas de comportamento. Rejeita tudo o que tenha uma conotação cultural, em função de um código-islã, adaptável a qualquer situação, seja no deserto afegão ou numa universidade norte-americana. Tanto efeito quanto causa da moderna perda de identidade cultural, essa corrente, muitas vezes quietista, pode, contudo, criar condições favoráveis a ações violentas.

Das madrassas (escolas religiosas) taliban, no sul do Afeganistão, aos sites islâmicos na Internet, passando pela televisão saudita e por inúmeras mesquitas na periferia de Paris ou de Londres, depara-se com uma mesma visão do islamismo, que os muçulmanos mais moderados (ou simplesmente mais tradicionais) chamam de “wahabita”. Os propagadores desse islamismo, no entanto, recusam, em geral, o termo, preferindo ser chamados de salafistas1. Não se trata de um movimento estruturado, mas de uma visão do islamismo que prioriza uma leitura literal e puritana do Corão, rejeitando, inclusive, a história do mundo muçulmano que se seguiu à sociedade ideal do tempo do Profeta e de seus companheiros.

A charia como norma única

Rejeita, logicamente, qualquer cultura que não seja estritamente religiosa: as artes plásticas, a música, a filosofia, a literatura, os costumes nacionais

Este neofundamentalismo2 pretende impor a charia (lei sagrada) como norma única para todo comportamento humano e social. Para tanto, rejeita, bastante logicamente, qualquer referência a uma cultura que se desenvolva ao lado, ou fora, do que seja estritamente religioso: as artes plásticas, a música, a filosofia, a literatura, os costumes nacionais, sem mencionar a celebração de datas festivas originárias de outras culturas (o Ano Novo, o Natal). Em relação às ciências, por outro lado, mantém uma relação meramente instrumental (sim ao computador; não à racionalidade científica). Essa versão do islamismo opõe-se violentamente ao cristianismo e ao judaísmo (e, num segundo momento, ao xiismo): isso vem do assassinato dos monges de Tibéhirin (1996) à proibição de construírem igrejas em território saudita (ao contrário do que ocorre no Egito, por exemplo, com a abertura dos Irmãos Muçulmanos com relação aos coptas3, ou no Irã, onde inexiste qualquer tensão entre cristãos e muçulmanos).

A obsessão dessa tendência neofundamentalista é a de traçar um divisor de águas entre a verdadeira religião (din) e a heresia (kufr), que perpassa o próprio interior da comunidade muçulmana. Portanto, denuncia qualquer compromisso religioso ou cultural assumido para com a cultura global dominante, que atualmente é a ocidental. Tudo leva a um código entre o que é lícito e o que é ilícito, inclusive em detalhes mínimos, tais como a forma de aparar a barba (os taliban afegãos) ou de escovar os dentes. A fatwa (decreto religioso que determina o caráter lícito das ações de qualquer pessoa – do uso de um cartão bancário à doação de um órgão) passa a ser a principal atividade dos ulemás e de lideranças religiosas auto-proclamadas.

Muitos contextos, os mesmos dogmas

Tudo leva a um código entre o que é lícito e o que é ilícito, inclusive em detalhes mínimos, como a forma de aparar a barba ou de escovar os dentes

Esse “neofundamentalismo” pode, no entanto, desenvolver-se nos contextos sociais e políticos mais variados. Uma organização como a Jama’at al-Tabligh (conhecida, na França, pelo nome “Fé e Prática”), por exemplo, é perfeitamente apolítica e legalista. Mas seus imãs, em pequenas mesquitas de bairro através da Europa, irão insistir para que as meninas usem o véu e não freqüentem as aulas de ginástica, assim como incentivarão os muçulmanos a não cumprimentarem as mulheres com um aperto de mão e a não responderem a cartões de boas-festas. Em Londres, líderes religiosos como Abu Hamza ou Omar Bakri são pródigos em lançar anátemas e apelos ao jihad.

O Hizb ul-Tahrir (Partido da Libertação), com base em Londres e que tenta atrair jovens muçulmanos de segunda geração, tem um discurso bastante radical (conclama a proclamação imediata do renascimento do califado para todos os muçulmanos e condena radicalmente qualquer tipo de participação na vida social e política do país anfitrião), mas não faz qualquer referência ao jihad nem recorre ao uso da violência.

Contradições sauditas e Al-Qaida

O wahabismo saudita cresceu e se consolidou contra as outras correntes islâmicas e não contra o Ocidente, com o qual se aliou por influência da família Saud

O wahabismo saudita, fundado por Abdel Wahhab (1703-1791), leva ao paroxismo a leitura literal das escrituras e a rejeição de qualquer compromisso com o que não seja estritamente islâmico (a ponto de ter destruído o próprio túmulo do Profeta para que este não se tornasse objeto de adoração). E cresceu e se consolidou contra as outras correntes islâmicas, e não contra o Ocidente, com o qual se aliou por influência da família Saud. Continua, porém, obcecado por toda e qualquer influência cultural ou religiosa ocidental – um dos motivos para a tensão em torno da presença de tropas norte-americanas no país. Os programas da televisão saudita destinados a muçulmanos que vivem no Ocidente denunciam qualquer forma de integração, embora apoiando a política pró-norte-americana da família real.

Existem, finalmente, movimentos como o Grupo Islâmico Armado (GIA) e a Al-Qaida, que defendem o jihad. Enquanto o GIA toma por alvo outros muçulmanos (a começar pelos membros da Frente Islâmica de Salvação, FIS, que não aderiu ao movimento), embora o objetivo seja erradicar a presença cristã na Argélia, a Al-Qaida centra suas ações nos Estados Unidos. Não faltam anátemas ou divergências entre esses movimentos: os salafistas criticam as “invenções” trazidas pelo Tabligh; os partidários de Osama bin Laden abominam a monarquia saudita; o Hizb ul-Tahrir recusou-se a apoiar o jihad defendido por Bin Laden. Divergem sobre o papel do jihad. Mas todos eles têm, em comum, uma certa visão do islamismo que se centraliza na aplicação estrita da charia, na recusa de um espaço cultural autônomo e na volta, individual, a uma prática estrita da religião, vinculada ao código do lícito e do ilícito.

Como se mantém (e reproduz) o wahabismo

O vetor de transmissão são as escolas religiosas. Dali saem os imãs e líderes que vão abrir mesquitas no Ocidente, ou são convocados a ser tornar guias espirituais de comunidades

Essas correntes são tão antigas quanto o próprio islamismo. Os taliban afegãos lembram os almohad do Marrocos medieval, quando tribos – pashtu, no caso dos primeiros, e bérberes, no caso dos últimos – se uniam em torno de uma personagem carismática para impor às pessoas da cidade um islamismo rigoroso, baseado exclusivamente na charia. A questão estaria em saber por que um movimento desses se desenvolveria nos dias de hoje em ambientes realmente modernos, a começar pelos muçulmanos que vivem em países ocidentais.

O vetor de transmissão são as escolas religiosas – como as madrassas, do Paquistão, e os institutos islâmicos situados na Arábia Saudita e no Golfo. Dali saem imãs e líderes religiosos que vão abrir mesquitas no Ocidente, ou são convocados por comunidades locais para se tornarem seus guias espirituais. O Tabligh é o movimento que utiliza mais sistematicamente a da’wat (sermão), que é feita por equipes internacionais que vão de porta em porta nas casas de muçulmanos. Essa “wahabização” parcial do ensino religioso era perceptível no Paquistão, onde a chamada escola de Deoband – famosa, em outros tempos, por transmitir uma forte identidade cultural, associada à herança lingüística e literária persa – foi “wahabizada” em duas décadas, sob a influência de banqueiros e líderes religiosos sauditas que vieram apoiar o jihad afegão contra os soviéticos.

Os sauditas tiveram um papel crucial na expansão do moderno neofundamentalismo. Para cortar as asas do nacionalismo árabe, assim como do xiismo iraniano e do comunismo, eles incentivaram, no plano religioso, um sunismo doutrinário muito conservador, mas também muito hostil ao Ocidente (a hierarquia religiosa na Arábia Saudita é bastante independente da dinastia dos Saud). Os wahabitas sauditas evitaram propagar o wahabismo propriamente dito, contentando-se em “wahabizar” o ensino das outras escolas, marginalizando tudo o que se pudesse articular com base nas grandes culturas do mundo muçulmano e destacando tudo o que fosse no sentido do hanbalismo (a escola que interpreta a lei de forma mais literal, entre as quatro grandes do islamismo). O conteúdo pedagógico foi reduzido, em proveito de manuais didáticos mais curtos, principalmente centrados no fiqh (direito aplicado) e nos ibadat (a devoção). A duração dos cursos também diminuiu: os cerca de quinze anos de estudo necessários à formação dos ulemás foram substituídos por períodos de três a cinco anos. A principal atividade dos professores (como os recém-falecidos xeques Ibn Baz e Al Albani) é a fatwa (no sentido clássico, de consulta jurídica) e a redação de tratados sobre o que é lícito e ilícito, divulgados na forma de pequenos livros didáticos, ou pela Internet.

Dinheiro para a intolerância

Para um jovem afegão refugiado no Paquistão, é mais fácil obter uma bolsa para estudar o islamismo na Arábia Saudita que conseguir asilo político na Austrália

Os sauditas puseram todo seu poder financeiro a serviço da divulgação dessa corrente. Organizações como a Rabita (Liga Islâmica Mundial) ou a Da’wah multiplicaram a criação de institutos islâmicos, de bolsas de estudos e de madrassas, muitas vezes financiados por bancos islâmicos sauditas ou por empresários, incentivados a dar o imposto islâmico (zakât) diretamente a essas instituições. Dessa forma, passaram aconcorrer com centros de ensino mais tradicionais, como a Universidade de Al Azhar, no Cairo. Tanto o valor das bolsas quanto as condições de alojamento são nitidamente melhores na Arábia Saudita do que no Egito. E, para um jovem afegão refugiado no Paquistão, também é mais fácil obter uma bolsa para estudar o islamismo na Arábia Saudita do que conseguir asilo político na Austrália.

Mas a propaganda saudita também gozou da aprovação tácita por parte dos grandes países ocidentais e muçulmanos, pois, na década de 80, era considerada um contraponto útil aos radicalismos da época (o islamismo iraniano e o comunismo). Considerando-se as excelentes relações entre a monarquia saudita e os governos ocidentais, seria previsível que essa propaganda religiosa se desse sob certo controle político. Como recusar a alguém um visto de entrada solicitado por uma embaixada saudita?

Mas não faz sentido tentar explicar tudo pelo dinheiro. Se, de fato, o neofundamentalismo vem avançando, é porque responde a uma demanda do “mercado religioso”. Em primeiro lugar, os grandes movimentos islâmicos clássicos (o Refah turco, a FIS argelina, a revolução iraniana, o Hezbollah libanês, o Hamas palestino e também uma parte dos Irmãos Muçulmanos), ou foram reprimidos, ou normalizados pelo exercício do poder ou por sua proximidade deste. Tal como o Hamas palestino ou o Refah turco, tornaram-se mais nacionalistas do que islâmicos. Não atendem às exigências de uma juventude “desterritorializada” e internacionalizada, seja pelo exílio, pelo estudo no exterior, seja pela imigração, e que não se reconhece em qualquer causa nacional: os palestinos de 1948 (assim como os do campo de refugiados Ein el-Hilweh, no Líbano), que sabiam que jamais voltariam às suas terras em caso de acordo de paz palestino-israelense, os trabalhadores imigrantes do Golfo, os sauditas excluídos do jogo político, os jovens de segunda geração que vivem no Ocidente, jovens diplomados em religião que vão de país em país em busca de empregos ou bolsas de estudos. Um número considerável de Irmãos Muçulmanos é empregado por instituições internacionais financiadas pelos sauditas, por não conseguirem status ou emprego em seu país de origem. O inglês e o árabe literário moderno tomam o lugar de suas línguas maternas.

Islamizar a globalização

Não faz sentido explicar tudo pelo dinheiro. Se o neofundamentalismo vem avançando é por que responde a uma demanda do “mercado” religioso A corrente transforma o que pensa ser uma perda da identidade cultural num discurso de refundação dos islamismo universal, purificado de costumes e tradições

Há traços semelhantes aos das seitas fundamentalistas protestantes, que também desfecham ataques contra a cultura em proveito de um código moral de comportamento

Diversas formas de religiosidade podem responder às novas exigências de uma população muçulmana globalizada, mas o neofundamentalismo adapta-se perfeitamente, pois transforma o que pensa ser uma perda da identidade cultural num discurso de refundação do islamismo universal, purificado de costumes e tradições, adaptável, portanto, a qualquer sociedade. Define o mundo global como uma umma virtual que exige, para se realizar, o esforço de todos os muçulmanos. Não se dirige mais a comunidades reais, mas a indivíduos isolados que se voltam para si próprios em busca de sua fé e de sua identidade. Os neofundamentalistas souberam islamizar a globalização, vendo nela os primórdios da reconstituição de uma comunidade muçulmana universal – na condição, evidentemente, de derrubar a cultura dominante: o ocidentalismo sob sua forma norte-americana. Porém, ao fazê-lo, nada constróem senão uma imagem-espelho dos Estados Unidos, sonhando com um McDonald’s hallal, ao invés de voltar à grande cozinha árabe dos verdadeiros califas de antigamente.

Transformando o islamismo em simples sistema de normas de comportamento, rejeitando tudo que tenha uma conotação cultural e substituindo-o por uma espécie de kit de código islâmico adaptável a qualquer situação – do deserto afegão às universidades norte-americanas –, o neofundamentalismo tanto é um produto quanto o agente da moderna aculturação. O islamismo dos taliban, assim como o wahabismo saudita ou o radicalismo de Bin Laden, são hostis a tudo aquilo que tenha uma conotação cultural, inclusive muçulmana: da destruição do túmulo do Profeta pelos wahabitas à dos Budas de Bayman ou à das torres de Nova York, o que se percebe é a rejeição de toda e qualquer noção de civilização e cultura, qualificada, talvez um pouco apressadamente, de “niilismo”.

Eles não são niilistas: são fundamentalistas, querem retornar à pureza de um primeiro islamismo, obscurecido por todas as construções humanas. Ao insistirem na umma, dirigem-se, na realidade, a uma universalidade vivida por muçulmanos que não se identificam com um território ou uma nação específica. A umma imaginária dos neofundamentalistas é bem concreta: é a do mundo global, em que a uniformização dos comportamentos se faz com base no modelo dominante norte-americano (língua inglesa e McDonald’s), ou na reconstrução de um modelo dominado imaginário (djellaba branca, barba... e língua inglesa). No comportamento dos neofundamentalistas islâmicos há traços semelhantes aos das seitas fundamentalistas protestantes, que também desfecham ataques contra a cultura em proveito de um código moral de comportamento, encontrando seu auditório em ambientes que, recentemente, perderam sua identidade cultural (os latino-americanos que vivem nos Estados Unidos são exemplo disso). Também o tema do born again é central em ambos os fundamentalismos, pois o discurso deve ser dirigido a pessoas que romperam com seu passado (e, muitas vezes, com suas famílias, como no caso dos jovens terroristas que pilotaram os aviões contra as torres gêmeas). Também permite desconsiderar o saber, tornando-se um pregador: não há necessidade de estudar para dizer a verdade. O neofundamentalismo faz-se acompanhar pelo individualismo e pelo autodidatismo.

A radicalização política não é, evidentemente, uma conseqüência direta dessa corrente religiosa: é necessário um fator adicional, que é o da islamização de um espaço de contestação anti-imperialista e terceiro-mundista4. Não existe um vínculo mecânico entre o desenvolvimento do neofundamentalismo e o terrorismo, mas é inegável que há um terreno comum, no qual o wahabismo saudita é, sem dúvida, a manifestação mais bem-sucedida. (Trad.: Wanda Caldeira Brant)

1Trata-se de uma referência aos adeptos do islamismo dos salafi – ou seja, o dos “precursores”, dos companheiros do profeta. Ler o artigo de Xavier Ternisien, Le Monde, 25 de janeiro de 2002. 2L’Echec de l’islam politique, ed. Seuil, Paris, 1992. 3Os Irmãos Muçulmanos egípcios sempre tomaram o cuidado de evitar conflitos de caráter religioso, e chegaram, inclusive, a cooptar cristãos por diversas vezes. O partido Wasat, nascido de uma dissidência dos Irmãos Muçulmanos, conta, em sua comissão de direção, com um membro da comunidade anglicana. 4 “L’islam de Ben Laden”, in “La Guerre des dieux”, edição especial do semanário Le Nouvel Observateur, janeiro de 2002.




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