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DOSSIÊ IRAQUE

Fim de reinado em Bagdá

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Ao contrário das vezes anteriores, o povo iraquiano parece acreditar que, desta vez, as ameaças norte-americanas de invadir o Iraque são concretas. Mas não sabe o que fazer: se a repressão de Saddam Hussein é ruim, uma ocupação estrangeira é pior...

David Baran - (01/02/2003)

O governo Bush não soube convencer os iraquianos da magnanimidade, da moralidade de uma guerra apresentada como missão civilizadora e obra de paz. Em compensação, desta vez, todos estão verdadeiramente convencidos de que as ameaças norte-americanas que, até há pouco, não levavam a sério, são concretas. Imaginavam uma dessas crises crônicas que agitam o país desde 1991 e das quais, estranhamente, o presidente Saddam Hussein sempre parece sair fortalecido... a tal ponto que os rumores de uma aliança mais que objetiva entre Bagdá e Washington tiveram imensa repercussão no Iraque.

Mesmo em dezembro de 1998, a operação “Raposa do deserto” não desencadeou quase nenhuma corrida às compras de provisões por parte da população

Essas crises periódicas, utilizadas como pretexto para campanhas de bombardeios com alvos muito específicos, suscitavam pouco mais que indiferença e resignação. Mesmo em dezembro de 1998, a operação “Raposa do deserto”, que marcou o apogeu de uma série de intervenções militares conduzidas ao longo da década de 90, não desencadeou quase nenhuma compra de provisões por parte da população. Na manhã dos primeiros ataques noturnos, os alunos foram às escolas ou à universidade, onde eram poucas as ausências. À noite, junto com a família, subiam aos telhados para observar o vôo dos mísseis e brincavam de tentar adivinhar onde cairiam. Os relatos desses dias de uma guerra muito especial quase chegam a ter um quê de férias.

Por quê mudaram os tempos

Atualmente, um nervosismo pouco comum toma conta do país. À primeira vista, tudo parece normal; no entanto, os indícios de tensão são múltiplos. A atividade comercial está parando. Todo mundo adia os planos de investimento ou de compra, exceto a compra de víveres. O preço dos carros cai. A taxa de câmbio do dólar varia brutalmente, às vezes batendo recordes (perto de 2.800 dinares o dólar), apesar dos imensos esforços das autoridades para controlar suas bruscas oscilações.

O mercado do câmbio, particularmente volátil, apenas expressa, ampliando-a, uma sensibilidade mais geral. Muita gente escuta os meios de comunicação estrangeiros, começando pela Rádio Monte Carlo e uma cadeia satélite iraniana, em árabe, legalmente acessível há alguns meses. Revistas importadas circulam entre amigos. Mesmo os que se dizem cansados das notícias passam adiante rumores que traem uma receptividade não confessada e inconsciente em relação à atualidade. O Iraque vive uma explosão da palavra, admitindo-se que o medo, a própria argamassa desse regime, regride progressivamente.

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Atualmente, os indícios de tensão são múltiplos: a atividade comercial está parando e as pessoas adiam planos de investimento e de compra, exceto víveres

De onde viria, então, essa certeza de uma nova mudança nos tempos? O tom das declarações norte-americanas não basta para explicar essa reviravolta. Por outro lado, as reações de Saddam Hussein levam a crer que a hora é decisiva. Aceitou, sem impor condições, a volta dos inspetores em desarmamento (Unmovic), dobrando-se à pressão norte-americana. Em seguida, convidou os agentes da CIA a se juntarem a eles, sugestão que foi considerada uma autêntica traição. Abriu, sem impor condições, os locais onde ficam os depósitos da indústria militar – e até seus próprios palácios, o que já motivara atritos com a primeira comissão de inspetores (Unscom). Desculpou-se junto ao povo do Kuait, mais de doze anos após a invasão do emirado – desculpas tardias, interpretadas no Iraque como sinal de “mesquinhez e covardia”. Em resumo, ele parece disposto a qualquer coisa para salvar seu poder pessoal, inclusive a sacrificar o Iraque e sua dignidade. Dizem os boatos que negocia, em sigilo, o petróleo, em troca de sua permanência no comando do país.

A humilhação da ocupação

Entretanto, essa certeza nova é também frágil. A expressão geralmente empregada para descrever o momento atual é “peça de teatro”. Os iraquianos são apenas os espectadores dessa intriga que se trama nos bastidores e as reais motivações da guerra de Bush parecem muito ambíguas: um empreendimento de tamanho risco deve ser explicado por meio de algumas razões sólidas, cínicas sem dúvida, mas que não dêem margem, justamente, a debates.

Em relação ao futuro, o governo Bush não propôs nenhum projeto digno de crédito. A oposição, esgarçada pelas querelas internas e desprovida de qualquer base social entre a população, só discute o “pós-Saddam” com os norte-americanos. Suas emissoras de rádio “subversivas” são consideradas tão confiáveis quanto os meios de comunicação oficiais, cujos métodos reproduzem (propaganda, desinformação, discursos combinados etc.), com conteúdo oposto. Os acontecimentos por vir parecem, pois, tão determinantes quanto imprevisíveis para aqueles que sofrerão, muito profundamente, suas conseqüências. É compreensível sua necessidade de falar, de explicar, de fazer conjecturas.

A imaginação no Iraque é liberada por essa necessidade irreprimível de sentido e pela ausência de um discurso de referência suficientemente coerente e estruturado para satisfazê-la de modo pleno. Como os norte-americanos não são vistos como libertadores, a representação que deles fazem é a da presença humilhante da ocupação. Alguns temem ter que apresentar documentos aos GI’s, em sua própria cidade, em cada esquina. Outros ficam indignados por antecipação diante da idéia dos marines, vitoriosos e arrogantes, vestidos de shorts, com uma cerveja na mão e que, aproveitando-se da pobreza reinante, se oferecem moças.

Incertezas valorizam o presente

O tom das declarações norte-americanas não basta para explicar a reviravolta, mas as reações de Saddam Hussein levam a crer que a hora é decisiva

A imaginação trabalha também para elucidar as razões subjacentes a esse destino doloroso, para identificar a força obscura e maléfica que estaria na origem de tanta injustiça e crueldade. A tese dominante, apoiada pelo regime e conforme a todo um imaginário árabe degradado, denuncia um imperialismo norte-americano visando a tomar, num prazo mais ou menos longo, mas certo, o controle dos recursos de um mundo árabe forçado a obedecer, vasta trama sobre um cenário de complô sionista, evidentemente... Essa convergência entre o palavreado oficial e a ficção popular não deve criar ilusões: aos olhos dos iraquianos, Saddam Hussein, campeão autoproclamado da luta contra os Estados Unidos e Israel, aparece, antes, como seu agente. Essa convicção faz temer que a guerra anunciada, apesar da pantomima da movimentação de tropas, não seja, afinal, escamoteada em proveito de um acordo secreto, amigável.

A ambigüidade da informação e a ambivalência dos sentimentos, a coexistência numa mesma pessoa de propósitos contraditórios, são típicas. Essa desorganização do discurso se estende, naturalmente, à guerra por vir. A mudança é desejada pela maioria da população. Mas incertezas em demasia valorizam muito mais o presente, o existente, o conhecido, do que a aventura da mudança. A guerra será curta ou será necessário suportar meses de penúria? Será melhor permanecer em Bagdá ou procurar refúgio no interior? Saddam Hussein utilizará armas não-convencionais contra seus próprios cidadãos? Um uso de gás de combate atribuído aos atacantes poderia, realmente, beneficiar a propaganda de guerra do regime, estimulando o ressentimento dos iraquianos.

O medo de represálias

Essas e outras questões resumem-se nisto: o regime acabará caindo, ótimo, mas a que preço? Como acreditar num futuro melhor que emerge de uma guerra que é apenas uma questão de interesses? A queda do edifício criará um vazio. Abrirá uma corrida ao poder cujos benefícios democráticos são imprevisíveis. Principalmente: quando se desfizer a malha fina constituída pelo partido Ba’ath1, pela polícia e pelo aparelho de segurança, quem irá conter as pulsões agressivas de uma população empobrecida, humilhada, frustrada e cheia de rancores? Em 1991, durante as perturbações que se seguiram à operação “Tempestade do deserto” - amplas insurreições classificadas de Intifada -, predominaram os saques e os acertos de contas.

Em resumo, Saddam Hussein parece disposto a qualquer coisa para salvar seu poder pessoal, inclusive a sacrificar o Iraque e sua dignidade

Prevendo represálias, inúmeros auxiliares do regime – do membro da célula local do partido ao alto responsável pela informação – preocupam-se com sua salvaguarda. No momento em que qualquer indício de deslealdade pode ser fatal, é-lhes impossível abandonar funções que, amanhã, os exporão à vingança de suas antigas vítimas. Alguns tratam de reconciliar-se com aqueles que humilharam ontem, explicando-lhes que, no fundo de si mesmos, não aprovavam as ordens... Outros escolhem a opção mais radical de mudar de residência, buscando o anonimato. Em caso de guerra, sua decisão, tomada com antecedência, consistirá em respeitar as instruções formais, mas sem empenho, para se precaverem contra uma sobrevivência milagrosa do regime sem criar novos inimigos. Dessa forma, inicia-se um jogo explosivo de reposicionamentos que só detonará, verdadeiramente, com o desmoronamento do regime.

O peso militar das tribos

O fato de existirem, no Iraque, tribos2 que formam comunidades muito estruturadas complicará essa fase de redistribuição de cartas. Dirigidas por personalidades sociais e políticas de peso, elas têm uma grande capacidade de mobilização de seus membros quando se trata de defender os interesses ou a honra da coletividade. Já estão bem abastecidas de armas (kalachnikovs, granadas, morteiros...), sem contar o material de que se apropriarão quando se der a decomposição do atual aparelho de segurança. Gozam de grande autonomia social e aplicam o direito tribal, principalmente em inúmeros casos de contenciosos. Pode-se, portanto, prever relações de força complexas entre as diferentes tribos pela partilha dos recursos (terras, água, armas, prestígio, habilidade etc.) e entre as tribos e o novo poder central. Complexas, elas correm o risco de se tornar, sobretudo, relações de forças armadas.

Essas tribos, diferentemente do Afeganistão, não serão de nenhuma utilidade para os Estados Unidos durante o conflito. As mais poderosas dentre elas não têm do que se queixar quanto à política do regime e continuarão em posição de força para negociar suas boas-graças junto a um governo de substituição. Não têm nada a ganhar com uma traição a Saddam Hussein - cuja sobrevivência, sempre possível, lhes custaria tudo. Ele já não sobreviveu a numerosas tentativas de assassinato, a diversos golpes de Estado, a uma guerra contra 33 países aliados? Assim, cada um conservará, sem dúvida, seu lugar no tabuleiro de xadrez, à espera do xeque-mate.

O fantasma da sublevação popular

A oposição, esgarçada pelas querelas internas e desprovida de qualquer base social entre a população, só discute o “pós-Saddam” com os norte-americanos

O cenário mais provável é o de um momento de virada. Nos primeiros tempos da intervenção norte-americana, o aparelho local de defesa e de segurança exercerá prudentemente sua função, os moradores sediciosos das antigas favelas de Bagdá e das cidades do Sul se manterão quietos, esperando o momento de agir. Depois, de repente, a hora do regime parecerá ter chegado. Ele se desintegrará brutalmente e a debandada será generalizada. Então começarão as insurreições, os roubos e os linchamentos, sem utilidade alguma para o desenrolar da guerra. Se divergem quanto a seus prognósticos e quanto à capacidade de resistência do regime, os iraquianos são, finalmente, unânimes em predizer esse próximo caos.

A perspectiva de tal momento de virada, ignorada por Washington, aparece, no início, do lado do regime, dos preparativos para a guerra. Seu objetivo é prevenir e atrasar esse momento, mantendo o controle da população pelo maior tempo possível. Ao contrário de um discurso oficial grandiloqüente, anunciando um levantamento em massa dos cidadãos contra o invasor, o regime espera de cada um que... fique dentro de casa. Ordens de toque de recolher devem ser dadas desde o início das hostilidades. Rações para se fazer face às necessidades alimentares até junho já foram distribuídas. Comunicados televisivos desestimulam as famílias de os revenderem, porque poderão precisar deles. Poços são perfurados por toda parte, em Bagdá e nas cidades do interior do país, formando uma rede de abastecimento administrada pelo Partido.

Treinamento para combates de rua

Os membros das estruturas locais do Partido em cada bairro deixaram as sedes, que constituem alvos potenciais, preferindo escolas como quartéis-generais. Daí dirigirão as missões que lhes forem confiadas. Sairão para distribuir água e álcool para o fogo (necessário para a iluminação, aquecimento e fogão), dos quais fizeram reservas. Cuidarão da manutenção da ordem através de um responsável do partido, designado para cada rua. Tacitamente, cada família será considerada coletivamente responsável pelo comportamento de seus membros. As saídas serão proibidas. As barricadas de sacos de areia foram erguidas nos cruzamentos de modo a garantir o controle cerrado das ruas.

Como os norte-americanos não são vistos como libertadores, a representação que deles faz o povo iraquiano é a da presença humilhante da ocupação

Essas missões levam em conta, de modo sutil, a psicologia dos servidores do regime. A maioria desertaria rapidamente se tivesse que combater na linha de frente, diante da formidável tecnologia norte-americana. Traindo a angústia que esta provoca, rumores mencionam tanques enfrentando obuses como se fossem balas de metralhadora, aviões com velocidade 25 vezes maior que a do som ou, ainda, mísseis que param em pleno ar para detectar um mínimo movimento. Protegidos nos bairros, se tornarão mais úteis no papel de manutenção da ordem, o qual exercerão com empenho. Contudo, estão sendo preparados para enfrentar, se necessário, eventuais combates de rua. Com essa finalidade, estágios de treinamento são assegurados pela Guarda Republicana e pelos “Feddayin de Saddam” 3. Kalachnikovs já foram distribuídas para algumas categorias da população. É provável que as autoridades cheguem ao ponto de esvaziar seus estoques de armas leves às vésperas do conflito.

A segurança de Saddam Hussein

O principal objetivo do regime consiste em manter o controle sobre a população. Nas cidades, onde são grandes os riscos de insurreição, o regime se apóia no partido e no aparelho de segurança, levando em conta a frágil lealdade de seus agentes. Fazendo pesar sobre eles a ameaça tácita de represálias, poupa-lhes, simultaneamente, um grau insustentável de engajamento. Não exige dos empregados da polícia política, da informação etc., que se sacrifiquem por quem quer que seja. Devem apenas exercer suas funções rotineiras. No campo, aplica-se o mesmo princípio de engajamento mínimo. Não se trata, particularmente para as tribos aliadas do regime, de ir combater inutilmente. Elas terão somente que impedir qualquer sublevação e qualquer infiltração nas zonas que ocupam.

Com líderes sociais e políticos de peso, as tribos têm capacidade de mobilização quando se trata de defender os interesses e a honra da coletividade

Essa estratégia visa a perpetuar, em período de crise, uma inércia que a população há muito tempo adquiriu em períodos de paz. A dispersão do pessoal de segurança, cujos locais são esvaziados ao menor sinal de alerta, aumenta sua eficácia e sua força de dissuasão. Uma propaganda bem feita bastará, então, para manter um grau de medo suficiente para inibir as veleidades de motim. Faltará garantir a salvaguarda do próprio presidente através de táticas ajustadas ao longo dos conflitos anteriores, privilegiando a movimentação rápida de uma fortificação à outra (multiplicação de falsos comboios presidenciais, deslocamentos em carros que se assemelham a carros comuns, alojamento surpresa na casa de famílias seqüestradas por uma noite etc.). Os rumores intensos sobre isso põem em cena um Saddam Hussein polimorfo, inatingível, inventivo, que explora todos os esconderijos possíveis de seu país, até a rede de fundações das enormes mesquitas em construção em Bagdá…

O enigma das forças convencionais

A irresistível supremacia militar norte-americana exclui qualquer tentativa de resposta clássica. O regime teria tudo a ganhar com um confronto que tivesse características simetricamente opostas às do projeto norte-americano. Uma guerra longa e que provocasse muitas vítimas, de um lado ou de outro, poderia determinar um momento de virada inverso, uma sublevação popular, desta vez contra o invasor. A política norte-americana, tolerável desde que derrube rapidamente Saddam Hussein, não é, entretanto, considerada menos injusta e imoral. O regime tem, então, o maior interesse em tentar levar os combates para as ruas.

Nesse cenário, qual seria o papel das forças convencionais, isto é, do exército regular e da Guarda Republicana, únicas forças armadas capazes de um confronto direto com o poder de fogo norte-americano4? Saddam Hussein não pode ter confiança alguma na fidelidade dessas tropas, nem no plano militar nem em termos de lealdade. Uma solução para esse problema consistiria em não exigir de seus homens senão fidelidade ao cargo no exercício de seus mínimos deveres. Já acantonadas fora de Bagdá, essas forças poderiam opor uma frágil resistência aos bombardeios e à penetração do exército norte-americano, deixando-o avançar pelo interior do país. Forças de elite mantidas na reserva poderiam intervir num segundo momento. Disseminadas no tecido urbano habitado, constituirão alvos difíceis para os bombardeios.

Um futuro imprevisível

Nas cidades, onde há riscos de insurreição, o regime se apóia no partido e no aparelho de segurança, levando em conta a frágil lealdade de seus agentes

Pouco importa que tropas sejam sacrificadas no campo de batalha; o regime deve buscar a criação de múltiplas zonas de combate. Então poderá esperar suscitar, se as sedições não o tiverem abatido antes, o momento da virada oposta. Mesmo a queda verossímil do regime não resolve em nada a questão de uma oposição violenta da população a qualquer presença norte-americana. Poucos, provavelmente, pegarão em armas para defender o regime; em compensação, as armas estão ao alcance da mão de muitos iraquianos que se dizem prestes a matar os soldados de uma força de ocupação.

Realmente, o contexto que se esboça parece propício a uma radicalização. Anos de privações e de humilhações, perpetradas tanto pelo regime de Saddam Hussein quanto pelas sanções, criaram um clima de tensões explosivas. A instauração rápida de uma democracia numa sociedade pacificada não é senão uma miragem. Na prática, os iraquianos estarão, é claro, disponíveis para novos discursos portadores de sentido, mas os discursos simplistas, dogmáticos e belicosos são, com freqüência, os mais convincentes - e um bom exemplo disso são os Estados Unidos.

Que dizem a respeito disso os principais interessados, os iraquianos, estranhamente ausentes de todos os debates? Um dirá que sua decisão já está tomada: se não houver guerra, deixará o país, incapaz de suportar o regime de Saddam Hussein “durante mais dez anos”. Outro, se tiver que escolher, prefere um presidente já “saciado” a eventuais sucessores esfomeados, insaciáveis, prestes a devorar um país já saqueado. Quanto a quem pensa que os Estados Unidos vão assumir plenamente suas responsabilidades, vão desenvolver um plano Marshall e vão garantir a paz e a prosperidade no Iraque - é um otimista que ainda precisa ser achado.

(Trad.: Iraci D. Poleti)

1 - Ler “Emprise vacillante du parti Baas en Irak”, Le Monde diplomatique, dezembro de 2002.
2 - Ler, de Faleh A. Jabar, “Parti, clans et tribus: un fragile équilibre” Manière de voir n° 67 “L’Empire contre l’Irak”, janeiro-fevereiro de 2003.
3 - Milícia criada pelo filho mais velho de Saddam Hussein, composto por jovens volutários deserdados selecionados a dedo.
4 - Ler, de Faleh A. Jabar, “O exército, a grande incógnita”, Le Monde diplomatique, janeiro de 2003.




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